De Tícia à Lets

Ela nasceu de madrugada. Como não poderia deixar de ser.
Antigamente era Tícia. E não Letícia. Aliás, taí uma coisa que teima em esconder: suas horas 'Letícia'.
Cresceu brincando sempre de aprender. Entrou na escola aos 6 anos, naquela época que não podia.
Foi oradora na sua formatura do pré-primário porque era a única que sabia ler.
A Tícia nunca gostou de brincar de comidinha. Preferia um lápis ou uma massinha de modelar.
Aprendeu a fazer poemas. E de tanto ver seu irmão desenhar cismou de querer aprender.
Até que um dia, apontando seus preciosos lápis-de-cor, cortou a perna. E por azar faltavam só dois dias para a apresentação de dança na escola. E ela dançou. Dançou até arrebentar seu curativo.
Ganhou estrelinhas douradas em matemática até a quarta série. Levou recuperação nela no terceiro ano.
Foi representante de turma na sexta-série e exonerada do cargo quando ganhou as eleições no terceiro ano.
Sua chapa do grémio foi banida. Seu bloco de Carnaval, campeão. Aventurou-se, em todas as férias, numa fazenda bem distante aonde nunca fui. Ainda não sei o que ela encontrou nesse lugar. Só sei que se chamava, e ainda se chama, 'Fazenda Paraíso'.
E então foi bem por ai que passou a ser Lets.
Foi metaleira, hippie, mau elemento, patricinha e meio psy. E tantas outras tribos que não sei o nome.
A Lets ainda desenha. Mas não precisa se cortar pra isso.
Ainda escreve. Mas nunca mais teve coragem de enfrentar uma plateia.
Ainda não brinca de comidinha. Graças a Deus!
Troca a noite pelo dia. Aprendeu que seu nome, como ela mesma, é plena alegria.
A Lets, talvez a Letícia Zazi também, aprendeu que coincidências não existem. Aceitou sua personalidade bem arisca e bem zombeteira. Meio bossa nova. Meio Rock n' roll.
Apostou nas segundas chances e na possibilidade de sempre ser o que quiser ser.
Deu a mão às pessoas. E ajudou muita gente com seu ar reservado e, ao mesmo tempo, espontâneo e apaixonante.
Esqueceu a matemática e apelou pro português.
E trocou um pouco da dança pelo taco de sinuca.
Trocou um amor por outro. E por outro. E por outro. E parou.
Enfim.
A Lets é um coração batendo no mundo. Mas um coração diferente de todos os corações que eu já conheci!


Foi com a ajuda da mamãe. Quase a quatro mãos.